* ou uma pequena reflexão sobre o corpo, auto-estima e mudanças.
Toda a família do meu pai tem joanetes nos pés. Na família da minha mãe temos uma estranha especificidade em que temos o segundo e terceiro dedos unidos na base. A genética está contra mim, mas não é só isso.
Pratiquei desportos em miúda, e a patinagem artística em especial lixou-mos ainda mais, umas vez que era obrigada a apertar os pés nas botas dos patins, com dois ou três pares de meias, que acentuaram a tendência para joanetes e calos nos dedos dos pés (que por serem tão longos já parecem amendoins) e que não há pedicure que safe. Por fim juntamos a isso uma característica só minha, de nas laterais exteriores dos meus pés, a estrutura óssea espetar-se algures ali a meio, coisa que por vezes me causa desequilíbrios absolutamente parvos quando ando de - pasme-se!- havaianas. Isto para além de alargar o meu pé, não me permitir usar alguns modelos de sapatos, e ser feio, claro.
Há pouco encontrei esta foto no meu instagram pessoal, de há dois anos atrás. E adorei revê-los.
Estes são os meus pés, aqueles que contam histórias de família e a minha história, no geral. Os meus amendoins, secos e com as veias sobressaídas, em vez do pé de Shrek que desenvolvi agora no final da gravidez. E digo-vos, estou ansiosa de tê-los assim novamente, feios como eram. Já não me lembrava muito bem do aspecto do "antes", e tenho pensado neles, tenho saudades de senti-los fortes e sem dores dos inchaços constantes.
Eu sei que os meus pés são tudo menos bonitos, mas não consigo de deixar de fazer tudo para que estejam confortáveis. Mesmo sendo mais feios agora, eles andam na areia, ou enfiados em chinelas, com todos os defeitos bem visíveis para quem quiser ver. Por vezes falhou a pedicure, mas nem por isso deixei de ir à praia, usar sandálias, apanhar ar quando precisavam.
E o mesmo se aplica a outras partes do corpo. Usei bikinis mesmo no auge do peso porque gosto de bronzear o máximo de pele possível, t-shirts com os cotovelos secos porque estava calor, saias com depilação por fazer (vá, saias compridas, mas é sempre um "risco").
Não quero dizer com isto que sou a favor de uma pessoa andar desleixada, mas por vezes temos de largar o controlo de querer estar perfeitas e só sairmos de casa se estivermos impecáveis e sem falhas. Quero estar arranjada e cuidada, mas não quero depender sempre disso. Quero sair um dia sem maquilhagem e não ficar incomodada por isso.
Compreendo perfeitamente todos os complexos que possamos ter, eu tenho imensos, mas não percebo como é que há pessoas que se deixam dominar por eles. A ponto de deixar de fazer coisas, de não sair de casa, de não usar peças de roupa específicas. Gostaria que ninguém se sentisse assim, gostaria que todos encarassem os seus defeitos de estimação como eu encaro os meus pés (eu incluída nos outros defeitos mais difíceis de aceitar). Sim, são toscos, feios, imperfeitos. Mas são fortes, suportam o meu peso, calçam os sapatos da minha vaidade, consigo apanhar coisas com eles porque os meus dedos têm imensa mobilidade, calço-os e pratico desporto com eles, fotografo-os em cenários descontraídos (olá clichés de Verão) e demonstram um estado de espírito pacífico. E isto são só os pés.
E se fizéssemos este exercício, de procurar os benefícios nas partes que menos gostamos no nosso corpo? E se nos desligássemos da absurda necessidade de tentar parecer bem? Aposto que quem me vê por aí nem repara nos meus pés feios. E se repararem... não vem mal ao mundo. Sou mesmo mais feliz assim...