segunda-feira, 5 de julho de 2021

39

 Assentei os pés nos 39 anos sem grande vontade. Não costumo ser esta pessoa que não gosta de fazer anos e que se quer fechar do mundo um dia por ano. Eu sempre gostei de fazer anos e nunca me incomodou o envelhecimento. 

Mas nos últimos 2/3 anos tem sido difícil digerir o avanço da idade. O peso (muito) extra que teima em ficar, os cabelos brancos que já deixei de contar, acordar com dores no corpo só porque sim, um cansaço que avança no cérebro e me faz esquecer mais do que eu gostaria (ainda assim, mantenho uma orgulhosa memória de elefante). Talvez seja só a maternidade, que de facto mudou tudo e tornou os obstáculos da vida um pouco mais difíceis, assim como nos videojogos. Agora sinto que jogo no nível máximo de ansiedade e desconforto. Não creio que volte ao training mode. Mas também não sei se quereria. Há algo neste desafio que me faz ganhar mais garra e força do que antes e isso também me agrada.

Mas não é bem sobre isto que quero falar. Gostava de explicar a minha questão. Não tenho grandes problemas em envelhecer, durante vários anos da minha infância e adolescência até me senti muitas vezes como uma pessoa idosa num corpo jovem. Mas o peso do número 40 está a desequilibrar a balança. É que gostei mesmo MUITO da década dos 30 e não me apetece nada sair daqui. Tem sido uma década feliz, em que me tenho sentido uma power woman em tantos níveis. Talvez tenha medo de não saber mantê-lo na próxima década. Ou talvez, à luz da dificuldade que tive em ter entrevistas de trabalho e nem uma proposta sequer, tenho receio de não conseguir ganhar dinheiro para continuar a ser uma mulher independente. Eu sei que estou num projeto giro e inovador, sei que estou a fazer mais e melhor trabalho que alguma vez fiz na vida, mas inevitavelmente, perante tanta porta fechada fico preocupada. E claro, há ainda aquele medo da 'minha' startup não vingar e isto se desvanecer.

Isto talvez nos leve a questões pertinentes do quanto da nossa identidade é o valor que nos dão no trabalho. Vou ser sincera, sempre fui razoavelmente bem considerada no trabalho, mas nunca fui uma estrela ascendente a somar elogios e aumentos salariais. Eu sempre fui a pessoa sólida e confiável. E no geral sempre estive bem com isso, nunca aspirei a grandes coisas, na verdade, aspirei sempre mais à minha liberdade e ao meu espaço do que a ser uma workaholic. Mas sem dúvida que talvez confunda o valor do trabalho com o meu valor pessoal, ou não deixaria estas questões me afectarem tanto.

Fiz um exercício giro com a minha irmã, no dia dos meus anos. Em todas as décadas da minha vida consegui atingir sonhos e patamares a que aspirei. Até aos meus 10 anos pude ter uma irmã (temos quase 9 anos de diferença, pelo que foi um penoso processo de pedinchice aos meus pais), entre os 10 e os 20, pude escolher a área que queria estudar, fui para Artes e mantive-me determinada nessas escolhas, vivi em pleno uma adolescência feliz. Entre os 20 e os 30, comprei uma casa, saí de casa do meu pai, conquistei a independência. E nos 30... libertei-me de uma relação que já não funcionava, recomprei a minha casa, vivi sozinha, encontrei novamente o amor e tive um filho. Foi uma década épica, de força e de determinação.

Terei receio de não saber encontrar sonhos aos 40? De já ter atingido o meu pico? Ou de serem sonhos mais loucos e estratosféricos e tenho medo de brilhar? Ou então, numa nota terrivelmente obscura, a minha mãe morreu com 46 e essa proximidade das idades incomoda-me (não que ache que vou morrer aos 46 também, mas há um peso absurdo que fica e parece que fico em expectativa).

Não sei. Não sei, mas vou descobrindo devagar, aprofundar com calma. Hei-de perceber como manobrar este navio. Não preciso das respostas todas agora, preciso sim, de saber que isto também se resolve. E que este processo de desvendar e recuperar também pode ser épico e uma das minhas maiores forças. 

Portanto, parabéns a mim, e que os 40 sejam festejados em pleno. Para já, concedam-me esta pequena neura.