quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Amamãetação, ou como isto custa como o raio - parte 3

Chegámos à terceira e última parte de posts sobre a amamentação. Não volto a fazer-vos uma destas tão cedo...

Pois bem, passadas as dores e as agonias a coisa começou a decorrer mais tranquilamente. Ele mamava bem, tinha força, e eu finalmente conseguia parar para respirar. Foi nesta fase que consegui retomar leituras com calma enquanto ele demorava eternidades a mamar. A sério, o miúdo demorava o tempo que queria! Dormia pelo meio. Por vezes pousava-o e 5 minutos depois queria leite. Não conseguia perceber quando estava satisfeito. Finalmente ele tinha atinado na mama e gostava muito da livre demanda. Não fazia intervalos maiores que duas horas, excepto de noite, que conseguia dormir umas 3 horas de seguida... de vez em quando. Não conseguia aumentar o intervalo de tempo entre mamadas, por muito que a pediatra e a enfermeira do CS insistissem.
Ele simplesmente ficava.

Entretanto, como ele crescia e as necessidades mudavam, a pediatra aumentou a quantidade de leite artificial. E aqui comecei eu a ficar desconfortável. A mastite já tinha passado, ou estava prestes a passar, vamos continuar a encher o miúdo de leite artificial? Agora que o meu corpo entrava no esquema tinha de correr o risco de desmamar? Não estava a achar muita piada.
Apesar de continuar a não adorar a experiência da amamentação em si, não queria ser empurrada para fora dela. Comecei então aos poucos a ler artigos sobre largar a alimentação complementar e dar mama em exclusivo. Sabia que era possível, sabia de uma experiência em primeira mão. Mas não sabia o como.
(Faço aqui o parênteses sobre o assunto de contactar ajuda especializada de uma enfermeira ou uma CAM. Eu tentei no início, mas em Agosto era uma fase de férias e nem toda a gente estava disponível, o grupo da Liga La Leche estava parado, a irmã de uma rapariga que conhecia, que é enfermeira especializada também esteve quase para vir ajudar, mas uma noite mal dormida ditou que o encontro não acontecesse e essa rapariga estava grávida de fim de tempo, não deu para outras combinações. Por isso isto foi tudo muito à base de procurar soluções e tentá-las organicamente.)

Então fui testando. Continuava a dar de mamar em livre demanda. Por vezes não dava o leite artificial (especialmente porque ele mamava com muita frequência, e não podia fazer intervalos menores que 3 horas), à noite, com a preguiça em aquecer biberões e afins, quase não dava e ele parecia bem e satisfeito. E aumentava de peso. Numa consulta de rotina disseram que podia tirar o leite artificial à vontade, que o meu era suficiente. Só dava leite artificial à noite naquela de ver se ele dormia mais (nunca funcionou) e ele continuava a desenvolver-se lindamente. Uma noite tirei o leite artificial e não notei diferença. E assim voltei a amamentar em exclusivo. 
No meio disto tudo, devo ter comprado umas 3 ou 4 latas de leite artificial. 
Olhando para trás, parece ter sido um processo relativamente simples, mas naquelas fases complicadas, na loucura das hormonas, fui muito infeliz. Ninguém nos prepara para isto.

Hoje em dia ainda amamento. Não planeei nada disto, não sei até quando vou amamentar, se vou desmamá-lo por livre vontade ou esperar até ele querer. O que sei sobre este assunto é:

1- Amamentar é uma cena pessoal. Nunca deveremos julgar ninguém ou tentar influenciá-la só porque não concordamos. Eu já tive em todos os lugares do espectro, desde odiar com todas as forças, como adorar profundamente a experiência. Chorei de dor e de alegria. Mas não quer dizer que seja assim com toda a gente. Respeito toda a mãe que amamenta até aos cinco, como a que amamenta 6 meses, como a que não amamenta porque não pode, como a que amamenta porque não quer. Eu tive alguma sorte com a minha experiência, insisti porque quis e por alguma preguiça em assumir determinadas mudanças. Não sou nenhuma heroína por ainda amamentar, mas tenho motivos para dar continuidade.

2- Deveríamos mesmo ter acompanhamento mais especializado disponível. A amamentação é pior do que a gravidez e a privação de sono, e birras, tudo combinado. Mil obrigados às enfermeiras do SOS Amamentação, às enfermeiras do centro de saúde que foram dando apoio e conselhos, às mães que, amamentando ou não, me deram muitas perspectivas sobre o assunto para eu poder decidir o que queria fazer. Procurem sempre apoio e ajuda se têm dúvidas.

3- Amamentar pode ser muito lindo, mas também pode ser a pior seca da vida. Quando o bebé demorava 40 minutos a mamar em cada mama (até chegar aos 3 meses, idade em que lá aprendeu a acelerar a coisa) eu andava a morrer uma morte lenta de tanto tédio. Vá que me fui orientando para ler durante o processo. Essa coisa do vínculo especial... eh! Há momentos muito bonitos e especiais, claro, muitos deles gerados da minha emoção, porque o Gonçalo sempre foi irrequieto e não ficava embevecido a olhar para mim nem me lia os pensamentos, como se poderia imaginar, mas também podem existir momentos em tantas outras circunstâncias, e  as vezes em prefere estar com o pai, que nunca amamentou? 
Faz tudo parte. Pode ser lindo mas não vai propriamente descer uma luz divina sobre nós.

4- É uma espécie de super poder. Não é bem, mas sinto-me como tal por isso... :P

Resumindo. Façam o que querem. O corpo é vosso, as mamas são vossas. O que interessa é um bebé alimentado e nutrido, e uma mãe que pode zelar pelo crescimento dele em paz consigo própria. Custou-me a interiorizar isto, mas é mesmo isto.
E fechamos este assunto aqui.

5 comentários:

Agridoce disse...

Antes de mais, parabéns e obrigada pela partilha de algo tão teu, tão íntimo, e que não foi nada fácil!

Há dias estive quase para escrever um post sobre uma nova competição a que tenho assistido no instagram: mães que se põem em bicos de pés, para dizerem há quanto tempo amamentam. E já vi isto em muitos e variados posts diferentes. E em nenhum deles isso lhes era questionado. (desculpa se também já o fizeste!)

Como ainda não tenho filhos, achei melhor ficar calada. Mas, de facto, choca-me que as pessoas não percebam que este tipo de comportamentos geram uma pressão tremenda sobre quem não pode ou não consegue amamentar... A mesma pressão que tu sentiste, quando as coisas corriam tremendamente mal, e pensaste desistir. Imagino que seja uma altura tão emocional, com tantos medos e dúvidas, que tudo isto só vai piorar!

Felizmente, no teu caso, não desististe e as coisas acabaram por correr bem. Mas é como dizes no final: cada caso é um caso e cada mãe sabe de si e do seu corpo. Para quê tanta competição?... Ainda bem que existem pessoas como tu, que não douram a pílula, que não têm problemas de dizer que custa, que não é a melhor coisa do mundo... Pode ser para uns, não tem de ser para todos.

Mas... És uma heroína e é mesmo um super poder :) E o que importa é que fizeste o que fazia sentido para ti, para vocês!

Analog Girl disse...

Querida Agridoce, obrigada pelo teu comentário. Nunca fui de ir fazer competição para o instagram e grupos de Facebook, mas já terei mencionado a minha experiência em algum lado certamente, se era pertinente para a discussão. Infelizmente isto das redes sociais e afins é muito complicado de filtrar, e ainda mais nestes assuntos da maternidade em que parece haver uma competição constante. Aliás, até ao vivo e a cores isso acontece sempre de uma forma um pouco subtil, à qual não acho piada, mas admito que não acho que seja completamente evitável. A partir do momento em que trocamos experiências, ainda mais em assuntos sensíveis, acabamos por nos fragilizar, e se alguém faz algo como nós gostaríamos de fazer, é capaz de ser uma defesa natural. Não sei, eu tento evitar mas talvez algum desse meu comportamento possa ser interpretado como tal. Mas acho que se formos compreensivas, mesmo quando entramos em comparações, tudo normaliza.

Quanto a tudo o resto, adoptei uma posição mais natural e descontraída. Tudo isto me deu imensos nervos e complicações. Ultimamente ando a ouvir muitas vozes opinativas sobre o desmame é que “tenho de começar a tratar disso” (e se é agressivo este discurso), mas na verdade quero apenas usufruir do que posso nesta fase. Amanhã já posso pensar diferente, mas uma coisa posso garantir que aprendi com esta experiência toda... tenho muito mais confiança em mim e no meu corpo e sei que vou tomar a decisão com base no que eu quero e o que me faz sentir bem e ao meu filho também. De resto, os cães ladram...

Agridoce disse...

Isso de ser mãe deve ser mesmo cansativo... Primeiro, pressionam-te para amamentares, depois pressionam-te para parares de amamentar... Ahahah! É todo um desafio à tua capacidade de encaixe, à tua tolerância e compreensão :)

Mas não tenho dúvidas de que tu sabes lidar com isso da melhor maneira, filtrando o que não interessa, e ouvindo o que mais importa: o teu corpo e a tua vontade!

Um beijinho, miúda!

м disse...

Não posso dar a minha opinião no lado da mãe pq não tenho filhos, mas posso dar a opinião do lado da filha que nunca foi amamentada. A minha mãe não tinha leite suficiente e eu precisei de ser alimentada com leite de fórmula. Estou aqui rija e o vínculo que criei com a minha mãe e com as outras pessoas não sofreu nenhum problema. A questão da imunidade, que é sempre aquilo que as nazis da amamentação defendem com unhas e dentes, é muito relativa. O meu irmão foi amamentado até comer papas e sopas e estava sempre metido no hospital. Ainda agora, que é adulto, fica imensas vezes doente. Eu nunca fui uma criança com propensão para ficar doente e assim continuo em adulta (espero que assim continue sempre).
Acho que cada pessoa deve fazer o que acha melhor para si, para o seu bebé e para a sua família, o que quer que funcione melhor nas suas vidas.

Eu sempre disse que não queria amamentar. Um dia que tenha filhos não sei pelo que vou optar, mas certamente quererei tentar nem que seja para saber como é a experiência. Visto do lado de fora, de quem não é mãe, não me parece que a amamentação seja aquela coisa linda e maravilhosa que descrevem. Sinceramente, acho muito desconfortável e até constrangedor, acho que prende completamente a mãe a rotinas que poderiam ser divididas com terceiros. Não sei se terei paciência nem feitio para me sentir fonte de alimentação ambulante nem tenho a pretensão que os meus filhos criem um vínculo mais forte comigo do que com o pai, como muitas mães parecem ter (na questão do vínculo que se cria entre mãe e filho durante a amamentação).

Olhando para trás, nos exemplos da minha mãe e das minhas tias, nunca as ouvi queixarem-se da amamentação e, portanto, desconhecia completamente esta realidade dura de quem passa alguma dificuldade no processo. Para mim, que sou leiga no assunto, até há uns anos achava que era uma coisa super fácil e natural, que não custava nada. Quando leio relatos como o teu, é que me cai a ficha. Isto de ser mãe tem muito que se lhe diga! Parabéns a ti por não desistires e quereres sempre o melhor para o teu filho. As mães são incríveis!

Analog Girl disse...

Querida M, andei tão longe do blog que nem reparei que tinha estendeu comentário por aqui...
Sei que o leite materno supostamente é o melhor mas realmente não creio que a imunidade seja uma coisa (apenas) adquirida através dele. Acho que todos somos diferentes com fragilidades e diferentes pontos fortes. Basta ver a tua situação e do teu irmão, muito óbvio! Isto também é válido para a questão do sono do bebé que é outro tema “quente” e que eu acredito que um dia vá abordar com calma num post.
Na verdade cada vez mais me apercebo que nada é linear, não somos robôs nem em adultos, muito menos em bebés ou crianças com tudo por aprender.
E também se aplicará a ti quando tiveres um bebé, pode ser que queiras experimentar, pode ser que não. Desde que estejas em paz... é mm o mais importante❤️