(post iniciado aqui)
A sala era alta, o tecto distava quatro ou cinco metros das tábuas do chão. Estas eram gastas e escurecidas pelo tempo. A velha senhora, de cabelo todo branco, vestida de preto, olhava-as pensativamente. Ocorreu-lhe subitamente que há muito que não se ajoelhava, não se sentava ou simplesmente tocava com a mão no velho chão. O pavimento de tábua corrida existia desde que se lembrava, aquelas mesmas tábuas, com os nós mais escuros aqui e além, desnivelados junto à porta, suavizados pelos passos dos anos.
Quanto tempo teria passado desde a última vez que sentira realmente o chão? Não se conseguia lembrar. Vivia ali há tantos anos, a sua infância, a sua adolescência, os casamentos dos irmãos e irmãs, o nascimento dos sobrinhos, dos sobrinhos-netos.
Lembrava-se vagamente de brincar com as crianças naquele pavimento mais velho que ela própria, mas não sabia quando fora.
Fazia-lhe confusão. A sua boa memória era o seu apanágio e de repente esta era posta à prova. E, que raio, o seu cérebro não lhe iria pregar mais partidas. Não se lembrava mais, mas isso não iria durar muito tempo. Não era à toa que lhe chamavam de teimosa.
Assim, determinada e corajosa como se sentia, deixou os trabalhos de tricô de lado e preparou os velhos joelhos. Deslizou suavemente da cadeira de baloiço, quando o joelho esquerdo se apoiou na carpete, o direito seguiu-o. A partir daí foi mais fácil.
De gatas, procurou a velha madeira rugosa do pavimento e tocou-a, seguiu-lhe os veios com a ponta dos dedos, a pele branca e delicada como papel, contra a aspereza do chão. Deitou-se. Um leve cheiro a pó e produto de limpeza desprendia-se da madeira. Sorriu. E espreguiçou-se. E deu uma gargalhada.
6 comentários:
Mais mais! :)
oh, fico sem jeito. :) Obrigada
Hei-de partilhar mais aos poucos mas aviso já que há alguns completamente insanos...
Eu assino em baixo da Rachelet: mais, mais, mais!
Tão simples, sem confusões, tão straight que é difícil perder a imagem! Também gostava de ser assim, mais concisa. Regra geral navego à volta de ideias e conceções.
Obrigada Andreia, mas confesso, gostaria de poder ter elaborado um pouco mais. Às vezes corro tanto para não perder pitada da história e deixo pormenores de fora. Talvez dê para equilibrar com o tempo e treino...?
Absolutamente.
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